Quem sou eu

Alguém que prefere usar as palavras à usar as pessoas.

quarta-feira, outubro 25, 2006

O gentil fã de Ryan Adams

Todos temos amigos.
Bons, falsos, legais, amigos de festa, amigos de colo, amigos de sempre, amigos do passado, do presente, de todas as horas...
E ah! Como são bons os amigos.
Quem não guarda uma boa recordação que ficou no passado e quem não quem conservá-los eternamente.
Mas toda regra tem exceção.
Tem aqueles amigos que chegam através de outros amigos, sabe, e acabam virando amigo também.
Chegam de madrugada quando você menos espera. Ou melhor, quando você está atrasada porque vai dormir lá na conchichinha para poder fazer uma entrevista importantíssima. Chegam em silêncio, com cara de quietinho, trazido por aquela sua amiga que é muito de confiança.
Você bate os olhos nele e já percebe. É um homem de bem!
Amigo de amiga minha é meu amigo. Isso é indiscutível.
Esclarecendo um pouco as coisas. Sua amiga apareceu porque estava morrendo de saudades de você, e resolveu aparecer as vinte e duas horas de uma quarta-feira em sua casa querendo comer lanche.
Você agradece, abraça, mas avisa que está de saída e não tem como desmarcar, ressaltando que seu ônibus já esta de saída.
E aí o homem silencioso demonstra que é um grande homem.
Pra evitar que vocês duas percam essa grande oportunidade de matar a saudade comendo um gorduroso as vinte e duas da noite de uma quarta-feira, ele se predispõe a levá-la até o seu destino naquela madrugada, seja lá qual for o seu destino.
As duas mulheres se voltam para aquela imagem de homem perfeito e soltam um som que se assemelha a “ownnnnn” denunciando mais do que simples encantamento. Ele acabou de ser simplesmente apaixonante.
Vocês, vão, comem o lanche a três, fazem aquelas coisas que você só se sente a vontade para fazer quando está entre amigos. Suja o rosto com maionese, lambe os dedos, e aquele homem diz pra vocês o quanto vocês ficam sexy lambendo os dedos, deixando vocês cada vez mais bobas e apaixonadas.
É chegada a hora de vocês pegarem a estrada. Você, uma grandiosa mulher, se preocupa em perguntar ao grande homem se ele sabe o caminho. É obvio que ele responde sim. Um grande homem, além de inteligente, cavalheiro, bem informado, também é bem vivido e conhece os caminhos mais obscuros.
Você então nem se preocupa de ligar para quem a espera em seu destino final para se informar de estradas, dicas e afins.
No caminho, põe um som country e eu pergunto quem é. Ele responde Ryan Adams e começa a endeusar o cantor. Ignoro a imoralidade quase suprimida na letra que dizia discretamente “fuck me up” entre os “come pick me up”.
Discuto a três com relação ao melhor caminho a ser seguido. Garanto a eles que a Dutra não tem pedágio e os dois se engalfinham pra convencer-me e a ambos que a Trabalhadores também não tinha.
Como não sou orgulhosa deixo-os seguir pela Trabalhadores ao som de Ryan Adams.
Não demora muito e enxergo ao longe os faróis piscantes imponentes do pedágio que é pago em meio ao silêncio, típico dos derrotados moralmente. E como minha religião prega a humildade, evito o sorrisinho cínico típico dos sarcásticos.
Mais uns trinta minutos de estrada e começa uma garoinha que vai engrossando timidamente. A garoinha começa a engrossar até se tornar uma chuva. Não torrencial, mas suficiente para turvar a visão do motorista.
Mesmo com a visão prejudicada, percebo quando o gentil homem passa a ponte do Tatuapé deixando pra trás a entrada necessária.
Nessa hora pulo do banco de trás, enfio minha cabeça no vão dos bancos dianteiros e preocupada pergunto a esse se não passamos da entrada.
Esse calmamente responde que sim, mais que deve ter outra ali na frente.
Cabreira, volto meu corpo ao banco de trás e olho o relógio que aponta meia noite.
Minha mente exclama “Meu Deus!” mas minha boca mantém o silêncio e meu corpo tenta não denunciar a tensão.
Mais quinze minutos andando em linha reta, sem sair da estrada, ligo a cobrar para a casa da minha amiga que está me aguardando, alegando que é para tranqüilizá-la, quando na verdade é para tranqüilizar a mim mesma.
Falo que estou na estrada e estou um pouco, hã, éééé, coff coff, perdida!
Ela pergunta onde estamos, eu pergunto ao motorista se ele sabe onde estamos, ele me responde um sim, mas não relata onde. Mudo a pergunta para ver se ele entende e pergunto: Mas aqui é onde? E ele responde novamente. Eu sei onde estamos! Só que dessa vez mais tenso.
Desligo o celular sem receber nenhuma ajuda específica e o meu amigo encontra uma saída. Ufa, que bom! Vamos parar de ficar andando perdidos em linha reta.
E dez minutos mais tarde eu afirmo que eu estava certa. Agora estávamos andando perdidos em círculos.
Triste mais real. Ficamos circulando, circulando. O cheese-salada começava a praticar contorcionismo em meu estômago, o suor começava a escorrer, a chuva não dava trégua, já beirava a uma hora e a calma do homem gentil estava me enlouquecendo.
Comecei a mostrar quem eu era. Fiz o parar no primeiro posto e pedir informações.
Muito a contra-gosto ele parou o carro, admitiu que estava perdido (aleluia!) e pediu informação.
Eu me lembro de cór da informação.
O senhor pega essa primeira aqui sabe, a direita, depois o senhor vai pegar a segunda a direita e por ultimo a primeira a direita de novo e vocês vão cair na marginal pra pegar a ponte do Tatuapé (aquela que nós tínhamos passado...)
Aí, eu perguntei já mais calma se ele havia entendido e este respondeu seguramente que sim, virou a chave do contato, engatou a primeira, acelerou o carro e... passou da entrada!
Surtei!
Surtei!
Surtei!
Não tinha mais admiração nenhuma por aquele homem. Nada de apaixonante, nada de cavalheiro, nada de bom, nada de nada.
Liguei novamente para minha amiga aos berros, tentava obrigar o dito cujo falar com ela no celular. Do outro lado minha amiga também aos berros tentava entender onde nós estávamos que ainda não havíamos chego. A minha outra amiga que tinha me enfiado naquela enrascada tentava inutilmente acalmar os ânimos de todos e eu quase surto com ela também. Como o dito cujo insistia em recusar de pegar o celular eu comecei a relatar pelo celular tudo que estava ao redor numa tentativa de ela me localizar. Graças a Deus ela localizou e eu fui ordenando bravamente conforme ela me instruía.
Entra ali!
Vira aqui!
Contorna aqui!
Sobe aqui!
Desce lá!
E foi assim que consegui chegar na casa da minha amiga as duas e meia da madrugada, cansada, com o cheese-salada desejando abandonar meu corpo por cima e por baixo simultaneamente, surtada, com previsão de acordar as cinco da nova madrugada para fazer a minha bendita entrevista.
Desejei boa volta aos meus amigos, sem me esquecer é claro, de desligar o celular (:-D).
Se bem que nenhuma vingança seria a altura da decepção que eu tinha tido naquela noite.
Hoje em dia quando eu conheço um homem gentil (raramente), eu sempre tenho o cuidado de perguntar.
Você curte Ryan Adams?

2 comentários :

Anônimo disse...

Isso pq vc perdeu a volta... no meio da madrugada, no meio da zona leste, sua amiga dizendo: "Para esse carro q eu vou descer!" rs...

Denise disse...

AAAAAAAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA